ONU alerta para ‘sinais claros’ do aumento da violência na República Centro-Africana

 Nações Unidas pedem ajuda para milhares de deslocados e refugiados centro-africanos em meio à maior onda de violência no país nos últimos três anos de conflito civil. Mapeamento indica mais de 600 violações em massa de direitos entre 2003 e 2015, incluindo massacres, estupros coletivos e ataques contra forças de paz.

Nações Unidas pedem ajuda para milhares de deslocados e refugiados centro-africanos em meio à maior onda de violência no país nos últimos três anos de conflito civil. Mapeamento indica mais de 600 violações em massa de direitos entre 2003 e 2015, incluindo massacres, estupros coletivos e ataques contra forças de paz. Chefe humanitária da ONU no país pede apoio da comunidade internacional.

Falando a representantes de governos no início de junho, na sede da ONU em Genebra, a chefe humanitária das Nações Unidas na República Centro-Africana, Najat Rochdi, afirmou que a frequência e a brutalidade dos ataques nas cidades de Bangassou, Bria, Arlindao e outras localidades atingiram os maiores níveis desde agosto de 2014.

“Nas últimas duas semanas, os sinais foram claros: a violência na República Centro-Africana atingiu uma nova escala crescente de conflito e a situação está se deteriorando rapidamente”, disse Rochdi. “Mais de cem mil pessoas foram recentemente deslocadas, famílias fugindo para sobreviver, deixando tudo para trás”, relatou.

Os conflitos entre a coalizão rebelde Séléka, majoritariamente muçulmana, e a milícia anti-Balaka, de maioria cristã, mergulharam o país de 4,5 milhões de pessoas em um conflito civil desde 2013.

Agentes humanitários enfrentam desafios de segurança e logísticos para alcançar as pessoas em necessidade, além da escassez de financiamento. A ONU pediu cerca de 400 milhões de dólares em nome da comunidade humanitária para atender as necessidades do país. Por enquanto, apenas cerca de 25% foi recebido, de acordo com o Escritório das Nações Unidas de Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA).

A porta-voz afirmou ainda que, sem os recursos suficientes, as pessoas em situação de vulnerabilidade não receberão mais ajuda, enquanto áreas inteiras do país pode ser abandonadas. “Esse não é o momento de desapontar a população centro-africana. Esse não é o momento de desistir da paz”, disse Rochdi.

Já o secretário-geral assistente da ONU para os Direitos Humanos, Andrew Gilmour, disse que ficou impressionado com as melhorias na capital, Bangui, com “mercados movimentados e sinais de crescente vida econômica”, bem como “polícia, justiça e instituições de responsabilização começando a se formar”.

Ele também advertiu, no entanto, que os grupos armados estão se unindo e continuam a cometer “ataques atrozes” contra mulheres e crianças, bem como contra as forças de paz.

“Este é um momento de liderança, parcerias reforçadas e uma abordagem coordenada que coloque os direitos humanos dos centro-africanos em primeiro lugar”, disse Gilmour, referindo-se à iniciativa da ONU para prevenir e responder antecipadamente a violações em massa dos direitos humanos.

“Os sinais de alerta estão surgindo e não devem ser ignorados”, ressaltou Gilmour.

ACNUR faz apelo urgente para refugiados

Para auxiliar a população desalojada, o ACNUR – a Agência da ONU para Refugiados – fez um apelo urgente para o financiamento de pouco mais de 209 milhões de dólares. Apenas 6% dos fundos foram arrecadados.

Desde que os conflitos entre os rebeldes se intensificaram, em maio, mais de 68 mil pessoas foram forçadas a deixar suas casas na República Centro-Africana. Dessas, 20 mil solicitaram refúgio na República Democrática do Congo.

Nas últimas semanas, ataques de grupos armados resultaram em deslocamentos nas províncias de Bria, Bangassou e Basse-Kotto. Muitas dessas pessoas estão desabrigadas ou instaladas em alojamentos improvisados. Apenas em Bria, mais de 41 mil se deslocaram e, segundo relatos, centenas de civis foram mortos.

Devido a situação da segurança, o acesso humanitário em várias dessas áreas continua extremamente restrito. Entretanto, o ACNUR conseguiu oferecer, por meio de uma resposta entre agências, itens de auxílio para os novos deslocados em Bria. O ACNUR planeja oferecer mais assistência, inclusive tendas, esteiras e cobertores para as famílias em situação de maior vulnerabilidade.

O recente surto de violência também está forçando pessoas a cruzarem a fronteira para as províncias Bas Uele e Ubangi, na República Democrática do Congo. Aproximadamente 20,5 mil centro-africanos se deslocaram entre as últimas duas semanas, de acordo com as estimativas. As equipes do ACNUR atenderam uma parte dos recém-chegados, enquanto os outros foram assistidos pelas autoridades locais.

Existem 503 mil deslocados internos na República Centro-Africana. Antes do último fluxo, existiam pouco mais de 102 mil refugiados centro-africanos registrados na República Democrática do Congo.

Treze anos de violência e impunidade

Homicídios em massa e outras graves violações de direitos humanos foram documentados pela ONU em um mapeamento que cobre múltiplos conflitos na República Centro-Africana entre 2003 e 2015.

Muitas dessas violações podem ser consideradas crimes de guerra e crimes contra a humanidade, afirma o relatório da ONU lançado no final de maio. O documento também propõe uma estratégia para combater a impunidade no país.

O mapeamento, realizado pelo Escritório de Direitos Humanos das Nações Unidas (ACNUDH) e pela missão da ONU na República Centro-Africana (MINUSCA), identificou padrões de violações feitas por forças governamentais, grupos armados locais e estrangeiros, bem como forças de defesas internacionais.

Foram reunidos 620 incidentes, como aldeias inteiras queimadas em ataques de represália, estupros coletivos de mulheres e meninas a partir de cinco anos de idade, mortes após tortura ou ainda maus-tratos em centros de detenção, violência étnica e religiosa, recrutamento de milhares de crianças por grupos armados e ataques contra forças de paz.

“O relatório da República Centro-Africana expõe o sofrimento desconcertante da população desse país rico em minério, mas que está entre os países em maior situação de pobreza do mundo”, afirmou o alto-comissário das Nações Unidas para os direitos humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein.

Reconhecendo a desafiadora situação de segurança no país, o relatório recomenda alguns passos a serem iniciados imediatamente para um processo de justiça transitória, incluindo uma estratégia de responsabilização no Tribunal Penal Especial para a RCA, o desenvolvimento de uma abordagem nacional para os direitos humanos nas forças de defesa, a necessidade de uma perspectiva de gênero em todo o processo de transição e a criação de uma comissão da verdade e da reconciliação.

“Conflitos sucessivos geraram vários processos de paz, mas, enquanto a impunidade reinar, essa terrível trajetória – com cada grupo armado cometendo ato
s de violência terríveis – pode continuar”, disse Parfait Onanga-Anyanga, representante da ONU na República Centro-Africana e chefe do MINUSCA.

“Ao documentar as violações e abusos no passado, esperamos estimular esforços nacionais e internacionais para proteger e trazer justiça às vítimas desses crimes”, afirmou Onanga-Anyanga.

Fonte: ONU BR

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