Por Rocio Paik, Imprensa Scalabriniana
A província de Cabo Delgado, que se localiza no extremo nordeste de Moçambique, tem vivido seus últimos três anos com vários conflitos envolvendo grupos armados e desconhecidos. 5 de outubro de 2017 foi a data em que se registrou o primeiro ataque na região.
Desde então, Cabo Delgado tem perdido mais de mil vidas, além de milhares de pessoas que tiveram que deixar seus lares. Aldeias, edifícios do governo, organizações não governamentais, instituições religiosas têm sido atacadas de forma violenta.
Em meio à crise, as Scalabrinianas se encontram nesses dias em uma missão para entender e auxiliar os deslocados na província de Cabo Delgado diante do cenário atual.
São mais de 250 mil deslocados da guerra e que vivem em campos. Alguns fugiram para províncias próximas e outros para países vizinhos. Mais de 50 mil deslocados estão na cidade de Pemba e, em média, 35 a 40 pessoas vivem em uma mesma casa só.
A Irmã Marinês Biasibetti, missionária scalabriniana e secretária geral da Comissão episcopal para Migrantes, Refugiados e Deslocados (CEMIRDE), está atualmente em Pemba. Segundo ela, “o desafio é o acompanhamento psicossocial, porque o sofrimento, os traumas, medo, pânico, perda, falta de perspectiva de melhores condições de vida… tudo isso gera criminalidade, violência, estresse, suicídio e ainda mais miséria.”
Para Irmã Marinês, a atual conjuntura apresenta vários desafios à missão como o acompanhamento às mulheres e crianças que perderam seus familiares que foram mortos ou se perderam na mata, envio de apoio assistencial para ações de promoção humana, implementação de projetos de auto-sustentabilidade, foco na missão em prol da defesa dos direitos humanos, cidadania, prevenção de tráfico de pessoas, reinserção das comunidades de origem dos deslocados, implantação de casas de acolhida na província, presença e missão permanente das irmãs da congregação MSCS na diocese.
Todos esses desafios estão contidos num outro mais amplo que é colocar fim à Guerra na província de Cabo Delgado.
E a Covid-19?
Assim como os casos de disseminação do novo coronavírus aumentam ao redor do mundo, existe uma expectativa de que a Covid-19 cresça em Moçambique, o que preocupa as Scalabrinianas que estão em missão no país, que atualmente conta com 2.079 pessoas infectadas pelo vírus, além de 15 óbitos, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Impactos da Guerra
Irmã Marinês enfatizou que a guerra em Cabo Delgado deixa visível os seus impactos na vida da população: mais pobreza, miséria, violência, violação dos Direitos Humanos, migração forçada, perdas de vidas humanas, mais doenças e sofrimento para a maioria das famílias.
Um dia em Muidumbe
Atualmente, o padre Edgard, missionário de Nossa Senhora da Salette ( saletino), está em missão em Muidumbe, distrito de Cabo Delgado. Os postos de saúde continuam fechados, o hospital está queimado, o pastoral da saúde tem recebido pessoas em buscas de remédios. Crianças com diarreia e caroço, problema de pele.
No início da tarde, às 13h, os padres Edgard e Hélio chegaram em Mueda, onde todos estavam comentando sobre o ataque a uma comunidade em Moçimbua. Enquanto caminhavam para comprar leite, chima e arroz para as crianças desnutridas, ambos encontraram um grupo de 28 pessoas – como mulheres, crianças e homens – que fugiam de um ataque em Litamanda.
Ainda no mesmo dia, mais uma triste notícia: a professora da escola secundária faleceu na hora do parto de gêmeos. Só uma criança sobreviveu.
“Estamos há três meses fora. Então a gente está com muita demanda de trabalho. Aqui é uma região que tem muito cupim, então a gente está varrendo salas de centro pastoral, igreja e todo esse ambiente pastoral. A gente tem que fazer almoço, cuidar de roupa, cuidar de casa. A gente conta com uma equipe muito pequena”, contou padre Edgar.
Os missionários têm ensinado a população a fazer soro caseiro – em especial para as crianças com caroços no corpo, a preparar chá de goiabeira, xarope de coração de bananeira e a multimistura.
Este é um dia em Muindumbe, província de Cabo Delgado.
Fonte: Imprensa Scalabriniana – SP