Da guerra à paz do cerrado: Como vivem as mães refugiadas no DF

idi braVindas de diferentes países, mulheres enfrentam desafios para aprender a língua, trabalhar, cuidar dos filhos e reconstruir a vida em terra estrangeira.

Vindas de diferentes países, mulheres enfrentam desafios para aprender a língua, trabalhar, cuidar dos filhos e reconstruir a vida em terra estrangeira.

*Artigo escrito por Ana Cristina Pereira, jornalista pós-graduanda em Jornalismo Digital e Produção Multimídia.

Tudo ficou para trás. Família, amigos, casa, pertences. O caminho percorrido por refugiados até um lugar seguro, longe de guerras, conflitos e perseguições, é repleto de histórias tristes. De dor e separação. Mas também de esperança em reconstruir a vida em terra distante e estranha. “Para não morrer, tive que fugir, deixando meus cinco filhos. Fiquei três anos sem vê-los”, conta Cecile, 43 anos, viúva, refugiada da República dos Camarões, em Brasília há um ano.

“Minha história é de muita dor e sofrimento. Tive que ter muita coragem”, diz ela, com os olhos marejados. O marido de Cecile foi assassinado em consequência de disputa de poder entre membros de um grupo étnico. “Sabia que seria a próxima a morrer. Precisava sair de meu país. Queria ir para a Alemanha, onde tinha parentes. Mas consegui visto para Cuba”, relata Cecile. (Os nomes das entrevistadas da reportagem foram trocados para preservar a identidade).

Desembarcou em Havana, capital de Cuba, completamente sozinha. “Em poucos dias, o dinheiro acabou. Sem notícia de meus filhos, chorava dia e noite”. Os cinco filhos ficaram em Camarões, com a mãe de Cecile. Com a morte da avó, ficaram sozinhos. Os filhos menores, gêmeos, na época da partida da mãe, tinham sete anos. O mais velho, de 20 anos, cuidou dos quatro menores.

“Em Cuba, um estudante de Benin me ajudou”. Em seguida, com apoio de diplomatas do Benin, juntou a documentação necessária para ir ao Haiti. “A situação no Haiti foi mais difícil do que em meu próprio país”. Depois de um ano no Haiti, Cecile obteve refúgio no Brasil.

Em maio de 2017, Cecile conseguiu trazer os cinco filhos para a Brasília. Foi quando a encontrei pela primeira vez, na inauguração do ateliê Mulheres que Inspiram o Mundo, na Asa Norte, criado com apoio do Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH) e Coletivo Bambuo. A mãe não continha a alegria de estar com todos os filhos perto.

“Meus filhos estão salvos, comigo”, diz emocionada. Os desafios, agora, são muitos: arrumar trabalho, colocar os filhos na escola, aprender bem o novo idioma. Cecile fala francês, sua língua materna, e inglês.

São 22,5 milhões de refugiados no mundo

Cecile é um dos cerca de 230 refugiados que vivem no Distrito Federal, segundo o Comitê Nacional para Refugiados (Conare), órgão interministerial presidido pelo Ministério da Justiça. No Brasil, são cerca de 10,5 mil refugiados.

Dados mais recentes da Agência da ONU para Refugiados (Acnur), divulgados em 20 de junho, dia em que se comemora o Dia Mundial do Refugiado, mostram que até o final de 2016, havia cerca de 65 milhões de pessoas vivendo fora de seus locais de origem, em virtude de algum tipo de conflito. Do total, 22,5 milhões são refugiados, número mais alto de todos os tempos.

A Síria continua sendo o local de origem de grande parte dos refugiados no mundo. Segundo a ONU, são 5,5 milhões de refugiados, em consequência da guerra civil, que já dura seis anos. Samira, 27 anos, é um deles. Ainda grávida, ela e o marido deixaram a capital síria Damasco, cruzando a fronteira em direção ao Líbano, onde nasceu sua primeira filha, hoje com quatro anos. Tempos depois, vieram para o Brasil. Em Brasília, Samira teve o segundo filho, que tem um ano.

Ver o país ser destruído pela guerra, separar-se da família, perder pessoas queridas são situações traumáticas. Os pais e o irmão de Samira e a família do marido também deixaram a Síria em momentos diferentes. Conseguiram refúgio na Suécia.

Apesar de gostar do Brasil e estar com filhos e marido, sente muita falta de tudo que deixou para trás. Indagada sobre qual é seu sonho, não hesita em responder: ” voltar para a Síria, assim que a situação por lá melhorar”.

A marroquina Aisha também teve uma filha no Brasil. No Marrocos, era professora. Apesar de estar há cinco anos em Brasília, fala pouco português. “É uma língua difícil. Minha filhinha se comunica bem em português. Em casa, falamos árabe e inglês”. Diz que sente saudade da família e de seu país, mas vive feliz no Distrito Federal. “O importante é ter liberdade para mim e para minha filha”.

Diferença entre refugiado e migrante

Segundo o Acnur, refugiados necessitam se deslocar para salvar suas vidas ou preservar a liberdade. Eles não têm proteção de seu próprio Estado e, muitas vezes, é seu próprio governo que ameaça persegui-los. Por isso, estão em situação muito vulnerável e têm proteção do Acnur.

Já os migrantes internacionais escolheram viver no exterior, principalmente por motivações econômicas e podem voltar com segurança a seu país de origem, se desejarem. Migrantes e refugiados são tratados de maneiras diferentes perante o direito internacional moderno.

Mãe de um menino de nove anos, a colombiana Rosário chegou a Brasília há três anos. Rosário, o marido e o filho deixaram o país pelos conflitos causados pela guerrilha das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). “Estávamos sofrendo muitas ameaçadas e perseguições das Farc e viemos para o Brasil”, explica.

Atualmente, vivem em uma cidade satélite de Brasília, em uma pequena casa que conseguiram comprar com o dinheiro da rescisão do marido. Rosário pede para não ser identificada nem ter o rosto fotografado. Não quer ser apontada como refugiada em seu bairro, onde a presença de estrangeiro chama a atenção.

Rosário diz que, muitas pessoas têm um conceito equivocado de refugiado. “Somos pessoas de bem que não podem mais viver em seu país. Quero criar meu filho, trabalhar e levar uma vida normal”. Rosário costura e vende comidas típicas da Colômbia.

Fonte: huffpostbrasil

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